Uma idosa muito inquieta... (Parte 1)
A Sra. AA, 78 anos, foi trazida pela
filha ao ambulatório em 7 de fevereiro de 2017. Como se tratava de uma idosa
bastante confusa, a entrevista foi conduzida principalmente com a filha.
A Sra. AA nasceu em Sabará-MG, mas
morava em Belo Horizonte. Completou o 1o grau em escola pública,
começou a trabalhar como costureira, casou-se, teve seis filhos e ficou viúva
aos 52 anos. Por volta dos 70 anos começou a ficar bastante esquecida: não se
lembrava da visita de um filho na véspera, telefonava várias vezes na mesma
manhã para fazer a mesma pergunta a uma filha, não conseguia mais executar
tarefas simples da costura. Após avaliação no Instituto Jenny de Faria foi
diagnosticada Doença de Alzheimer na fase inicial e elaborado um plano de
tratamento.
A idosa deixou de trabalhar e
mudou-se aos 74 anos para a casa da filha, que morava sozinha, no andar térreo
de um pequeno prédio. A filha também era costureira e trabalhava (em casa mesmo)
o dia inteiro, de segunda a sexta, e nos sábados de manhã. Frequentemente
recebia os clientes nestes horários para tirar medidas e experimentar as
roupas.
Aos poucos a idosa tornou-se
dependente para executar tarefas mais complexas, como telefonar, controlar seus
medicamentos, fazer uma compra na padaria. Precisava de alguma supervisão no
banho e nas refeições, mas estava sempre tranquila, bem humorada e bem
disposta, embora muito esquecida.
Fazia diariamente uma caminhada de
30 minutos com a filha em uma praça perto de casa no final da manhã. Estava em
tratamento de hipertensão arterial com enalapril 20 mg/dia e de osteoporose,
com alendronato de sódio 70 mg em dose semanal. Na tentativa de reduzir alguns
sintomas da Doença de Alzheimer, utilizava donepezila 10 mg no lanche da noite.
Desde janeiro, no entanto, o
comportamento dela mudou drasticamente. Acordava irritada e passava o dia
inteiro agressiva, andando sem parar pela casa; passou a recusar o banho e o
almoço. Só ficava tranquila na caminhada do final da manhã, e bem mais tarde
novamente, a partir do horário do lanche da noite; por sinal, horário em que se
alimentava muito bem. Curiosamente, a partir do lanche da noite, voltava a
ficar tranquila. Assistia as novelas, se deitava para dormir no mesmo horário e
passava bem durante a noite toda. Ao amanhecer, acordava irritada novamente.
Mais curiosamente ainda, nos sábados de tarde e nos domingos a idosa estava
sempre tranquila.
Neste período não surgiram sintomas
clínicos (como febre, dor, emagrecimento ou sintomas respiratórios, cardiovasculares,
digestivos, urinários) que pudessem explicar esta alteração do comportamento.
Ela utilizava os mesmos medicamentos e o seu exame físico estava completamente
normal. A rotina de trabalho da filha e da visita dos clientes também não
mudou.
A filha estava muito preocupada,
pois morando sozinha com a mãe, em virtude deste novo quadro da mãe não estava
conseguindo manter sua atividade como costureira.
Você tem ideia do que poderia estar
acontecendo? Seria o caso de acrescentar um neuroléptico ao tratamento da
Doença de Alzheimer? Qual droga você escolheria? Em que hora deveria se
administrado?
Já adianto: menos de uma semana tudo
voltou ao normal na casa da Sra. AA.